A empresa canadense de fertilizantes Nutrien, maior produtora de potássio do mundo, anunciou neste começo de 2020, a compra da Agrosema Comercial Agrícola, rede de distribuição de insumos com sede em Elias Fausto (SP). No final de 2019, a Bunge, uma das maiores trading companies do mundo e a maior exportadora do agronegócio no Brasil, adquiriu participação na empresa Agrofel Grãos e Insumos, uma revenda gaúcha.
Essa parece ser uma tendência de movimento no setor do agronegócio, a aquisição de distribuidoras e revendedoras de insumos. Isto se explica por algumas características dessas distribuidoras: a atuação em um mercado que têm mantido sua rentabilidade e sua importância na balança comercial brasileira, a baixa concentração de empresas, o acesso direto que estas distribuidoras têm aos produtores e a uma gama de informações e o fato de que quase todas essas distribuidoras ainda são empresas familiares.
A baixa concentração de empresas na área da distribuição de insumos e o fato de que a quase totalidade dessas distribuidoras são empresas familiares, tornam este mercado propício para movimentos de concentração mediante operações de fusões e aquisições. Considerando, ainda, que muitas dessas empresas não se sofisticaram em termos de administração e governança, há grande margem para negociações de valores nessas operações, atraindo a atenção de compradores e investidores.
Pelo lado das empresas interessadas, o acesso às informações sobre produtores, em geral clientes fieis daquelas distribuidoras, bem como o acesso às informações sobre a evolução das respectivas lavouras, é um instrumento valioso não só para avaliar o risco de crédito daqueles produtores, mas para antecipar o volume da produção de grãos e, com isso, avaliar como se comportará o mercado. Para a indústria de insumos particularmente, essas informações são estratégicas para definir o mercado de seus produtos, fidelizar clientes e mitigar riscos de crédito, enquanto para as tradings companies essas informações permitem planejar a originação (compra) de grãos.
Os mesmos fatores que tornam este mercado atrativo são, no entanto, fatores que o tornam um desafio para os departamentos jurídicos e escritórios de advocacia. Superar as estruturas familiares que permeiam as distribuidoras para que as exigências de governança e compliance das investidoras sejam atendidas, precificar corretamente a operação e construir as garantias adequadas de lado a lado, são as principais dificuldades a serem enfrentadas pelos advogados.
Não é surpreendente que muitas operações tenham que ser precedidas de organizações societárias das empresas alvo da operação e que as due diligences (processos de análise de documentos e contingências dessas empresas alvos) sejam mais complicadas e exijam mais cuidados do que aquelas realizadas em empresas maiores.
Por outro lado, em termos de aprovação dessas operações no Cade, ainda neste momento do mercado, se pode esperar menos resistência e maior velocidade nas respectivas análises, como parecem demonstrar aquelas operações mencionadas no começo deste artigo.
Mas estas operações não devem ser as únicas a movimentar o setor do agronegócio. Este ano de 2020 promete ser um ano de retomada de investimentos e de consolidação de alguns mercados que, com maior ou menor dificuldade, enfrentaram a crise econômica dos últimos anos. Essa retomada sem dúvida irá provocar uma reavaliação de muitos ativos que estiveram depreciados, por isso é possível apostar em uma corrida para as novas operações de fusões e aquisições, e o setor é, sem dúvida, muito atrativo no momento, ainda mais com as recentes promessas do Governo Federal de modernizar o crédito no setor (vide a publicação da recente MP 897, de 01 de outubro de 2019, e os projetos de regulamentação da aquisição de imóveis rurais por estrangeiros, como o PL 2.963/19)
Conhecer profundamente esse mercado e estar preparado para atender aos desafios propostos é o que se deve esperar dos advogados que irão auxiliar as empresas nessas importantes operações.
*Frederico Favacho é sócio do Mattos Engelberg Advogados e membro do Grain and Feed Trade Association (GAFTA) e da Federation of Oils, Seeds & Fats Associations (FOSFA)
Fonte: Estadão