A Arbitragem e a Mediação como meios de solução de conflitos no mercado de artes

15 . abril . 2019

No filme “A Dama Dourada” (Woman in Gold – 2015), dirigido por Simon Curtis, Helen Mirren vive o papel de Maria Altmann, uma judia sobrevivente da Segunda Guerra Mundial que decide processar o governo austríaco para recuperar o quadro “Woman in Gold”, de Gustav Klimt – retrato de sua tia, Adele Bloch-Bauer, que fora roubado pelos nazistas durante a ocupação e,  terminada a guerra, cedido para o governo da Áustria e mantido em exposição na Galeria Austríaca Belvedere.

Em 1998, o Parlamento austríaco aprovou uma lei que restituía as obras de arte expropriadas ou até negociadas depois da guerra para as famílias que tiveram seus bens roubados. No entanto, a comissão encarregada de avaliar os casos no ano seguinte não se mostrou favorável à devolução do “Woman in Gold”, considerando que a última vontade de Adele, disposta em testamento e que deixava o quadro para a Galeria Austríaca Belvedere, era válida.

Maria Altmann ajuizou uma ação contra a República da Áustria, nos EUA, onde residia. Em primeira e segunda instâncias, ela conseguiu vitória. Contudo, no ano de 2004, a Suprema Corte fez o julgamento do processo “Republic of Austria et alii v. Altman”, mantendo a decisão contrária à devolução do quadro.

Em 2006, no entanto, Maria Altmann recorreu à arbitragem onde finalmente obteve uma decisão favorável à restituição do quadro à sua família. Nessa época, ela já tinha quase 90 anos. Clique para ler a íntegra da sentença arbitral deste caso

Este é um caso famoso que projeta a importância e o papel da arbitragem na solução de conflito envolvendo disputas sobre obras de artes, mas, obviamente, é um caso de disputa bem específica e não representa os conflitos mais comuns neste mercado. Estamos falando de disputas surgidas em inventários inter vivos – nas separações judiciais de casais e de sociedades – e causa mortis, na partilha de heranças, além de conflitos entre artistas e seus marchants, artistas e galerias, galerias e seus clientes, clientes e as grandes empresas de leilão, entre museus e colecionadores privados, em contratos nacionais e internacionais.

O mercado de artes tem suas peculiaridades. Talvez seja um dos mercados mais exclusivos que se possa mencionar, seja por conta dos seus atores, seja em razão da especificidade do produto objeto de mercado. Por conta disso, conflitos nesse ambiente dificilmente receberão um tratamento apropriado nos meios ordinários de solução de conflitos, em especial no poder judiciário. Seja pelo interesse na confidencialidade dos contratos, no anonimato dos grandes colecionadores, na reputação dos grande dealers, a arbitragem e a mediação servem muito bem como meio de solução das disputas que possam surgir internamente.

Nesse sentido, em 7 de junho de 2018, começou a funcionar a Corte de Arbitragem para a Arte (CAA, na sigla em inglês), em Haia, Holanda, uma iniciativa conjunta do Netherlands Arbitration Institute e da ONG Authentication in Art, coordenada pelo advogado americano William Charron.

Ainda, como demonstração do incremento da atenção da arbitragem internacional ao mercado de artes, em 14 de junho de 2018, a Corte de Arbitrajem de Madrid realizou a sua “I Conferencia sobre Arbitraje y Mediacion en Arte y Patrimonio Cultural”, que contou com a colaboração do Centro de Arbitragem e Mediação da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI).

O setor de arbitragem não pode, realmente, ignorar a importância do mercado de arte assim como este mercado não pode ignorar a importância da arbitragem e mediação como meios privilegiados para a solução dos conflitos e disputas entre seus atores.

O relatório de Art Basel (link) tráz algumas informações que demonstram a importância do mercado de artes e como o setor de arbitragem doméstica e internacional deve estar preparado para entender aquele mercado:

  1. As vendas no mercado global de arte em 2018 atingiram US $ 67,4 bilhões, aumento de 6% ano a ano. Este segundo ano de positivo o crescimento trouxe o mercado ao segundo nível mais alto em 10 anos, e tem avançado valores de vendas de 9% sobre a década de 2008 a 2018.
  2. O número de transações atingiu seu nível mais alto desde 2008, aumentando 2% ano a ano para uma estimativa 39,8 milhões de transações.
  3. O setor de leilões (incluindo tanto os públicos quanto os privados) representaram 46% do mercado, com queda de 1% ano a ano, enquanto o setor de revendedores (incluindo revendedores, galeria, e as vendas no varejo somente online) representaram 54%.
  4. Vendas nos três maiores mercados – os EUA, o Reino Unido, e China – representaram 84% do mercado mundial valor total em 2018
  5. Estima-se que, em 2018, havia 310.700 empresas operando no mercado global de arte e antiguidades, empregando cerca de 3 milhões de pessoas, o que era relativamente estável em 2017.
  6. Estima-se que, em 2018, o comércio global de arte gastou US $ 20,2 bilhões em uma gama de serviços de apoio externo diretamente ligados a seus negócios, um aumento de 3% em relação ao ano anterior, apoiando 375.030 novos empregos.
  7. A maior área de despesas foi em feiras de arte, que alcançaram US $ 4,8 bilhões, um avanço de 5% ano-a-ano e representando 24% do total de despesas acessórias. A segunda maior área foi a publicidade e o marketing, que totalizaram US $ 3,2 bilhões, um aumento anual de 12% após dois anos de queda.
  8. O relatório aponta ainda que o Brasil é o país mais bem representado em feiras de arte na América do Sul.

 

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