Planos de Saúde Acessíveis
Não é de hoje que se discute a qualidade da atenção à saúde no Brasil. Mas a recente notícia sobre a criação de planos de saúde acessíveis reacendeu o debate, mais que necessário, sobre a regulação do mercado de saúde suplementar. Há anos, as intervenções do governo no mercado de saúde suplementar têm sido desastrosas. O plano de saúde acessível é apenas mais uma delas, já que não soluciona um problema criado pela própria regulação, sob o falso propósito de “desafogar o SUS”.
Há alguns anos, a ANS impôs limitações para o reajuste das mensalidades dos planos individuais, o que praticamente fez com que o produto deixasse de ser oferecido pelas operadoras. A partir de então, o mercado passou a investir nos produtos coletivos (planos por adesão ou planos empresariais), em que a regulação é mais flexível e não há limites para reajuste.
Os efeitos desta mudança foram logo sentidos pela iniciativa privada. Dada a escassez no mercado de produtos individuais, as empresas passaram a ser cada vez mais demandadas por seus empregados para a oferecer planos de saúde empresariais, como forma de suprir esta lacuna. Consequentemente, as empresas que não oferecem plano de saúde aos seus empregados perdem competitividade – pesquisas demonstram que, do ponto de vista do empregado, o plano de saúde é considerado, atualmente, o benefício mais importante, superando os planos de previdência privada e os seguros de vida.
Se, por um lado, a empresa que oferece plano de saúde aos seus empregados se torna mais competitiva em relação aos seus concorrentes, os custos futuros decorrentes da oferta do benefício podem comprometer a sua sustentabilidade ou, no mínimo, provocar grandes reflexões sobre a sua conveniência. Isto também é efeito direto da falta de produtos individuais, já que o empregado, ao se desligar da empresa, tende a requerer no Judiciário a sua reintegração ao plano de saúde anteriormente oferecido por sua antiga empregadora, como forma de garantir para si e para sua família o acesso ao sistema de saúde suplementar.
O Poder Judiciário, por sua vez, em resposta a esta demanda cada vez mais crescente, tem determinado a reintegração destes empregados, independentemente de ter ou não havido o cumprimento dos requisitos dispostos nos arts. 30 e 31 da Lei n. º 9.656/1.998. Como decorrência desta reintegração indiscriminada, o custo direto e indireto suportado pelas empresas com o oferecimento do plano de saúde tem se elevado rápida e assustadoramente, o que deve piorar com o aumento da expectativa de vida e envelhecimento populacional.
Mesmo nas hipóteses em que Sindicatos e Entidades de Classe possibilitam a contratação de planos de saúde coletivos aos seus associados (planos coletivos por adesão), o custo com as mensalidades, por vezes, encoraja o beneficiário a pedir judicialmente a sua reintegração ao plano empresarial.
Algo semelhante ocorreu no mercado dos seguros de vida, no período de hiperinflação.
Clínicas e laboratórios populares, bem como soluções inovadoras como o Dr. Consulta ou o Dr. Agora, dentre outras opções de custo acessível, sem dúvida representam um grande avanço. Estão longe, contudo, de resolver um problema ainda maior, que foi criado a partir de uma regulação ineficiente e pouco debatida, que em nada tem colaborado para o desenvolvimento do setor, tampouco para desafogar o Sistema Público de Saúde.
Não se trata de ser contra ou a favor dos planos de saúde acessíveis. As medidas a serem adotadas devem, efetivamente, ser uma resposta ao problema identificado, o que só será possível por meio de uma revisão profunda e crítica da regulação, em conjunto com o amplo e cuidadoso debate com a participação das operadoras, médicos, sindicatos, associações de classe e empresas. Caso contrário, ao invés de estimular o desenvolvimento do mercado, a ANS poderá ser responsável, mais uma vez, pela criação de distorções. O mercado precisa urgentemente de um remédio e não de mais uma dose de veneno.